
O que está acontecendo no Brasil?
1. Política – Na segunda-feira (9), o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) entregou a proposta do Auxílio Brasil ao presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL). O novo programa social é uma reformulação do Bolsa Família. A definição dos valores não foi apresentada e deverá ocorrer até o fim de setembro. Bolsonaro tenta viabilizar um reajuste de pelo menos 50% para o Auxílio Brasil, contemplando mais de 16 milhões de famílias.
Na terça-feira (9), o Plenário da Câmara dos Deputados rejeitou, por 229 votos a favor e 218 contrários, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 153/19 que propunha o voto impresso no Brasil. A matéria precisava de 308 votos favoráveis para ser aprovada.
No mesmo dia da votação da PEC, veículos militares transitaram pela Praça dos Três Poderes, a caminho do Campo de Instrução de Formosa, para convidar o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e o ministro da Defesa, Walter Braga Netto, para a realização de exercício militar. Parlamentares criticaram a presença dos veículos, no dia da votação da proposição sobre o voto impresso.
O senado aprovou, na terça-feira (10), projeto que revoga a Lei de Segurança Nacional (LSN), criada em 1983. O projeto revoga os crimes de calúnia e difamação contra os presidentes dos Três Poderes, e prevê punições para atos de incitação à guerra civil, insurreição e espionagem. A matéria já tinha sido aprovada pelos deputados federais em maio e segue para análise presidencial.
Na CPI da Pandemia, o depoimento do líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR) foi polêmico e a sessão foi interrompida. Barros deverá ser convocado para um novo depoimento. Está prevista uma acareação entre o ministro do Trabalho e Previdência, Onyx Lorenzoni, e o deputado federal Luis Miranda (DEM-DF), para quarta-feira (18).
A Câmara dos Deputados concluiu a votação, em primeiro turno, da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 125/11, a PEC Eleitoral. Na quarta-feira (11), a proposta da volta das coligações partidárias foi aprovada, mas a retomada do chamado “distritão” foi rejeitada. O “distritão” estabelecia que os deputados federais, estaduais e distritais seriam eleitos pelo sistema majoritário, em que os mais votados são eleitos, independentemente do peso do partido. Como parte do acordo para derrubar o “distritão”, foi articulada a volta das coligações para as eleições proporcionais (vereadores, deputados estaduais e federais), permitindo a sobrevivência de mais partidos pequenos. As coligações foram extintas em 2017 por meio de emenda constitucional. A matéria está pautada para ser votada pelo Plenário da Câmara na terça-feira (17). Caso seja aprovada, será enviada para o Senado, onde a tendência é de rejeição.
O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF) atendeu a uma notícia-crime apresentada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Moraes determinou a abertura de investigação contra o presidente Bolsonaro por vazamento de inquérito sigiloso. De acordo com a denúncia, Bolsonaro teria divulgado investigação aberta pela Polícia Federal (PF) para apurar invasão do sistema interno do TSE em 2018.
O presidente do PTB, Roberto Jefferson, foi preso preventivamente na sexta-feira (13). O ministro Alexandre de Morais, do Supremo Tribunal Federal, acatou pedido da Polícia Federal (PF) para detenção de Jefferson pelos crimes de calúnia, incitação ao crime e manifestações “atentatórias ao estado democrático de direito”.
2. Economia – O envio do Auxílio Brasil foi seguido de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para parcelar o pagamento de precatórios, estimados em R$ 90 bilhões para 2022, e criar um fundo para o pagamento de precatórios e abatimento de dívida pública. Precatórios são dívidas judiciais da União com empresas, servidores e beneficiários da Previdência. O governo propôs diluir o pagamento dos precatórios acima de R$ 66 milhões, que deverão ser pagos em dez parcelas, sendo a primeira de 15% e o restante em parcelas anuais, bem como alterou para a Selic o índice de reajuste para todos os precatórios. Técnicos criticaram a proposta de criação do Fundo Brasil, associando a ideia a uma nova edição da chamada “contabilidade criativa”.
O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, manifestou preocupação com o ambiente fiscal. Campos disse que é impossível um banco central controlar a expectativa de inflação com o “fiscal descontrolado”.
Bancos privados estimam inflação em torno de 7% para 2021.
3. Administração pública – A Controladoria-Geral da União (CGU) indicou que há sobrepreço de até R$ 130 milhões em licitação do Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR) para comprar 6.240 tratores e máquinas agrícolas. O MDR iniciou procedimentos para renegociar os contratos com indicativo de sobrepreço ou, nos casos em em que não for possível, cancelar a compra.
O ministro da Educação, Milton Ribeiro, afirmou que as universidades brasileiras deveriam ser para poucos. A declaração gerou polêmica e foi feita em entrevista à TV Brasil. Ribeiro defendeu a promoção dos instituto federais, com ensino tecnológico e profissionalizante, criados em 2008, como forma de aumentar a produtividade do Brasil.
Uma análise:
1. A tendência política está negativa. Desde o começo desse relatório, esta foi a pior semana para a política. Com baixos índices de apoio popular, mas com uma coalizão no Congresso ainda favorável, Bolsonaro sofreu duro revés político esta semana, resultado, principalmente, do elevado nível de conflito institucional.
As adversidades no Legislativo foram grandes. Primeiro, Bolsonaro viu sua principal bandeira do último mês fracassar. O governo ainda tem maioria na Câmara, o que pôde ser observado pelos 229 votos a favor do voto impresso, surpreendendo a maioria dos analistas políticos que aguardavam algo em torno de 120-150 votos a favor. Apesar disso, a rejeição da matéria mostrou ao governo os limites da coalizão parlamentar. Só para entender em números o que isso significa: 39% da bancada do PP, partido do ministro da Casa Civil e do presidente da Câmara, votou a favor da matéria. No PL, partido da ministra da Secretaria de Governo, que é responsável pelas negociações políticas, o número foi mais baixo ainda, com apenas 27% de votos favoráveis. Já nas bancadas do MDB e DEM, 46 e 47% votaram pela aprovação da PEC. Os partidos que mais votaram foram PSC (100%), PSL (85%) e Republicanos (82%). Segundo, no Senado, a revogação da LSN também não foi bem recebida pelo governo.
Se no Legislativo a semana foi ruim, os dissabores foram maiores ainda no Judiciário. Bolsonaro foi incluído no inquérito do STF sobre vazamento de informações, sendo o quinto inquérito do qual Bolsonaro agora faz parte. Além disso, houve a prisão de Roberto Jefferson, um dos mais radicais apoiadores do presidente Jair Bolsonaro. E ainda existe a possibilidade de Bolsonaro apresentar, na segunda-feira (16), um pedido de impeachment contra os ministros Alexandre de Moraes e Luis Roberto Barroso. Ou seja, não há sinais de arrefecimento do conflito institucional.
Enquanto as bases eleitorais mais fiéis de Bolsonaro apreciam esse conflito, boa parte do eleitorado que votou nele na eleição passada parece não apoiar essas atitudes. É possível que a continuidade desse enfrentamento institucional possa diminuir ainda mais as chances de reeleição de Bolsonaro. Além disso, pode ser que a situação chegue a um ponto em que os defensores de Bolsonaro percebam que sua postura não atrairá mais eleitores, prejudicando as bandeiras da direita conservadora. Os sinais de melhoria política ainda não apareceram.
2. A tendência para a economia continua positiva, mas alguns indicadores começam a influenciar as métricas para uma tendência de neutralidade. Do lado fiscal, depois de certo alívio nos meses anteriores, o risco aumentou significativamente. A ideia de turbinar um novo programa social sempre foi um problema. A proposta do governo, em busca de dividendos eleitorais, parece perigosa, tanto pela ampliação no valor médio quanto na quantidade de famílias beneficiadas. Além disso, a forma encontrada pelo governo, de parcelamento dos precatórios, gerou o ruído de calote, adicionando mais problemas de expectativas. Por fim, a observação de Roberto Campos Neto sobre a questão fiscal é um alerta importante de um banco central formalmente independente. Subir a taxa básica de juros indefinidamente para combater a inflação com o lado fiscal “descontrolado” só vai piorar a situação econômica.
3. A tendência da gestão pública está neutra, apesar da declaração desastrosa do ministro da Educação. Outros fatores que causariam mudança nas métricas ainda são apareceram, tanto para o lado negativo quanto para o positivo.