
O que está acontecendo no Brasil?
1. Política – A pressão do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em relação às urnas eletrônicas gerou reações dos demais Poderes da República. No Judiciário, logo na segunda-feira (2), o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), por unanimidade de seus ministros, decidiu abrir inquérito sobre as acusações de Bolsonaro de que as urnas eletrônicas são inseguras, bem como sobre a ameaça à realização de eleições. O TSE ainda pediu ao STF que incluísse Bolsonaro como investigado no caso das fake news. Na quarta-feira (4), o ministro Alexandre de Moraes, do STF, acatou o pedido e incluiu o presidente Jair Bolsonaro em investigação para apurar a possível prática de 11 crimes.
O presidente do STF, Luiz Fux, ao abrir os trabalhos do Supremo Tribunal Federal (STF) na segunda-feira (2), fez menções às garantias democráticas, afirmando que há limites que devem ser respeitados. Na quinta-feira (5), diante do aumento das críticas de Bolsonaro aos ministros Alexandre de Moraes e Luis Roberto Barroso, Fux anunciou o cancelamento da reunião que ocorreria entre os chefes dos três Poderes. Na sexta-feira (6), Fux conversou com o procurador-geral da República, Augusto Aras.
No Legislativo, o presidente da Câmara dos Deputados, deputado Arthur Lira (PP-AL), afirmou que o “botão amarelo continua apertado”, mas mostrou boa vontade com o governo ao dar sobrevida à discussão da PEC 135/19. Já o presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), foi mais enfático e disse que quem pregar que não haverá eleições em 2022 “será considerado inimigo da nação”.
Ainda em reação às críticas de Bolsonaro sobre as urnas eletrônicas, na quarta-feira (4), grandes empresários, banqueiros e intelectuais divulgaram manifesto em defesa do sistema eleitoral brasileiro.
Na quinta-feira (5), a comissão especial da Câmara dos Deputados sobre a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 135/19 rejeitou o relatório do deputado Felipe Barros (PSL-PR) que propunha contagem manual e pública de votos obrigatoriamente impressos, teria aplicação imediata e reduzia as atribuições da Justiça Eleitoral. Na sexta-feira (6), a comissão especial aprovou o relatório que rejeita a PEC 135/19. As comissões especiais que analisam propostas de emendas à Constituição apenas fazem recomendações por meio de relatórios. Embora não exista norma que impeça que PECs com recomendação pela rejeição sejam levadas ao Plenário, elas geralmente não chegam ao Plenário. Por isso, o anúncio do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), de pautar a matéria é correto, embora não seja o usual. Para a aprovação de uma PEC no Plenário da Câmara, são necessários pelo menos 308 votos favoráveis em duas sessões.
A Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público (CTASP) da Câmara dos Deputados aprovou convocação do ministro da Defesa, Walter Braga Netto, para explicar supostas ameaças à realização de eleições. O ministro deve comparecer à comissão no dia 17 de agosto.
Pesquisa da Quaest mostra que de julho para agosto não houve variação significativa na aprovação ou rejeição do governo Bolsonaro. A pesquisa completa está aqui:
2. Economia – A balança comercial brasileira registrou superávit de US$ 7,6 bilhões em julho. É o segundo melhor resultado da série histórica para o mês desde 1989. De janeiro a julho, o superávit acumulado é de US$ 44,13 bilhões, um aumento de 47,6% em relação ao mesmo período do ano passado. O Ministério da Economia projeta um superávit comercial de US$ 105,3 bilhões para 2021, o maior volume a ser registrado para um ano, mais do que o dobro do valor alcançado em 2020.
Na quarta-feira (4), confirmando as previsões do mercado, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) decidiu aumentar a taxa básica de juros em 1 ponto percentual. Com esse aumento, a Selic passa de 4,25% para 5,25% ao ano. Foi a quarta alta consecutiva, e o Copom sinalizou que realizará novo aumento, de mesma magnitude, em setembro. A nota revelou que o BC entendeu que a inflação é persistente, mudando a avaliação de que a inflação era temporária e pontual.
Por 286 votos a favor e 173 contra, a Câmara dos Deputados aprovou o projeto de privatização dos Correios. A matéria segue para o Senado com a previsão de que também seja aprovado até setembro.
3. Administração pública – Bruno Bianco foi nomeado ministro-chefe da Advocacia-Geral da União (AGU). Ele substitui André Mendonça, que se concentra para a sabatina que deverá enfrentar no Senado Federal para a vaga de ministro do STF. Bianco assumiu recentemente a secretaria-executiva do Ministério de Trabalho e Previdência e era chefe da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia.
O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) divulgou que foram desmatados 8.712 km2 entre agosto de 2020 e julho de 2021 na Amazônia. É o segundo maior desmatamento registrado, com uma quede de 5% em relação ao período anterior.
Uma análise:
1. A tendência política está negativa. Como previsto semana passada, o principal fator foi o aumento do conflito institucional. A solidez da coalizão aumentou desde a indicação de Ciro como ministro da Casa Civil, e o apoio popular não alterou significativamente, mas permanece baixo.
A influência da política na elaboração de políticas públicas tinha tudo para ter uma semana muito positiva. A aprovação da privatização dos Correios e a perda de tração da CPI da Pandemia, combinados com a chegada de Ciro Nogueira, davam ao governo um cenário tranquilo para a semana. A única ressalva era em relação ao voto impresso, que vinha gerando tensões e conflitos desde o dia 29 de julho. A reação do Judiciário foi dura, e o conflito pode durar mais tempo do que o desejável. O Congresso, contudo, ainda titubeia em adotar um posicionamento mais firme. Essa simbiose entre Planalto e Câmara dá sobrevida ao presidente, mas também vincula o presidente da Câmara a ter uma reação mais lenta e moderada. A ida do ministro da Defesa à Câmara dos Deputados poderia distensionar a questão do voto impresso, mas é pouco provável que isso ocorra.
Bolsonaro deve enfrentar algumas semanas difíceis. O apoio popular está baixo, os grandes empresários e os banqueiros retiraram seu apoio ao governo e a coalizão pode sofrer alguns abalos no futuro. A CPI da Pandemia está perdida na narrativa da corrupção e se distanciou de averiguar os atos de gestão do governo, dando algum fôlego ao governo.
O conflito institucional está no seu pior nível, gerando muita instabilidade. Ainda há apoio legislativo, o que se pode notar pela aprovação da privatização dos Correios, mas não o suficiente para garantir a agenda governamental. Diminuíram as garantias de que os nomes de André Mendonça para o STF e de Augusto Aras para a PGR serão aprovados com tranquilidade no Senado. De qualquer forma, essas turbulências políticas reduzem a previsibilidade de resultados, com impactos negativos no mercado financeiro e no setor produtivo. Nesse contexto é que deve ser entendido o manifesto de grandes conglomerados econômicos, ainda assustados com o efeito da pandemia nos negócios. A última coisa que querem é um governo instável.
2. A tendência para a economia continua positiva. Os resultados de comércio foram positivos e a decisão do Copom atendeu às expectativas do mercado financeiro, rendendo elogios ao Banco Central. Economistas vinham alertando que o BC estava com uma postura behind the curve, muito cautelosa, significando que os remédios de combate à inflação estavam aquém do que se esperava. Se a decisão de elevar a taxa básica de juros pode trazer maior controle à inflação, ela também pode trazer maior risco fiscal.
O avanço da privatização dos Correios é boa notícia e mostra o compromisso do governo com a pauta econômica liberal. Foi um passo importante. Se de um lado o governo progride em reduzir o tamanho do Estado e aumentar sua eficiência, por outro lado ele resiste, ao procurar formas de aumentar os programas sociais. Embora seja crucial apoiar as camadas mais pobres da população, bem como adotar medidas para reduzir as desigualdades socioeconômicas, não se pode deixar de observar que tais iniciativas são parcialmente motivadas por questões eleitorais e devem ser observadas com atenção.
3. A tendência da gestão pública está neutra. Embora tenham ocorrido diversas exonerações e nomeações, nos últimos dias, tanto na Casa Civil quanto na Secretaria de Governo, ainda não houve alterações significativas na gestão do desempenho.