
O que está acontecendo no Brasil?
Política – No domingo (21), o presidente Jair Bolsonaro reuniu-se com alguns apoiadores às portas do Palácio da Alvorada para comemorar seu aniversário. Na ocasião, ele fez comentários duros criticando os governadores por causa de medidas restritivas.
Ainda no domingo, um grupo representativo de economistas, banqueiros e empresários publicou uma carta aberta exigindo mais eficácia no tratamento da Covid-19. A carta, enviada aos representantes do Judiciário, Legislativo e Executivo e publicada nos meios de comunicação, foi assinada por centenas de líderes, incluindo ex-ministros das finanças, professores e banqueiros de peso, como Roberto Setúbal e Pedro Moreira Salles do Itaú Unibanco, e José Olympio Pereira do Credit Suisse no Brasil. De modo geral, eles pediram (1) uma vacinação mais rápida, (2) incentivos ao uso de máscaras, (3) implementação de medidas de distanciamento social e (4) coordenação nacional de ações.
Na terça-feira (23), Bolsonaro fez um pronunciamento nacional de que o governo está tomando medidas para enfrentar o Covid-19.
Na quarta-feira (24), Bolsonaro reuniu-se com os presidentes do Poder Judiciário, o ministro Luiz Fux, e de ambas casas legislativas, o senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG) e o deputado Arthur Lira (PP-AL), governadores estaduais e ministros do governo para discutir a criação de um comitê estratégico contra a Covid-19.
Após a reunião, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), fez um discurso duro no qual criticou a resposta do governo; caso contrário, medidas legislativas seriam postas em prática. “Os remédios legislativos são conhecidos e amargos, alguns, fatais”, acrescentou ele. Lira também disse que há um limite para todas as coisas. No dia seguinte, Bolsonaro e Lira tiveram uma reunião de portas fechadas e disseram que não há discordância entre eles.
O Ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, participou de reunião no Senado na quarta-feira (24). Ele foi questionado e criticado por senadores sobre seu desempenho na obtenção de apoio internacional para combater a Covid-19 no Brasil. Felipe Martins, assessor internacional de Bolsonaro que acompanhou o ministro na audiência, foi seriamente criticado pelos senadores por fazer um gesto considerado ofensivo no Brasil e utilizado por supremacistas brancos de direita. Martins explicou que ele estava ajustando sua lapela. No dia seguinte, os senadores aumentaram a pressão para a demissão de Araújo, abriram investigação contra Martins e estão buscando maneiras de dificultar o próprio funcionamento do ministério até a demissão do ministro. No domingo (28), Araujo entrou em uma discussão pública com a senadora Kátia Abreu (PP-TO), presidente do Comitê de Relações Exteriores do Senado Federal, acusando-a de fazer lobby a favor de Huawei para participar da licitação 5G. Os senadores protestaram com veemência.
2. Economia – O Congresso Nacional aprovou o Orçamento Federal de 2021, na quinta-feira (25), e o enviou para sanção presidencial. Houve uma diminuição no montante destinado a diversas áreas, como a assistência social, a previdenciária e os subsídios aos pequenos agricultores. A maior parte foi realocada para aumentar o orçamento para projetos do Ministério do Desenvolvimento Regional, destinado a emendas parlamentares. Técnicos do Ministério da Economia advertiram que o orçamento aprovado é altamente desafiador e representa uma ameaça para o funcionamento básico do governo. Um exemplo foi a redução de 90% do orçamento destinado ao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), responsável pelo censo brasileiro.
A Toyota, seguindo outras montadoras, anunciou interrupção de 7 dias de trabalho de sua produção de automóveis no Brasil. A paralisação é para evitar a propagação da Covid-19 entre os trabalhadores.
Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central do Brasil, afirmou que a taxa Selic continuaria a estimular a economia.
O Ministro da Economia, Paulo Guedes, atacou o trabalho e as previsões fiscais feitas pela Instituição Fiscal Independente (IFI), um cão de guarda fiscal do Senado. Guedes disse que as previsões econômicas do FII são errôneas e imprecisas. Políticos e economistas criticaram amplamente suas observações.
3. Gestão Pública – Marcelo Queiroga, o novo Ministro da Saúde, participou de várias reuniões ao longo da semana. Em todas elas, ele defendeu políticas baseadas em dados científicos para enfrentar a Covid-19. Além disso, ele determinou que todos os funcionários públicos do ministério deveriam usar máscaras durante o trabalho. Queiroga também sinalizou que planeja desmilitarizar o ministério, substituindo o pessoal militar por profissionais da saúde.
O número de novos casos e mortes de Covid-19 no Brasil continua a se expandir. Apesar das imprecisões no cronograma de vacinação, a produção nacional de vacinas e as importações estão aumentando. Queiroga afirmou que o Brasil poderá vacinar 1 milhão de pessoas por dia em abril.
Rodrigo Limp Nascimento, o Secretário de Energia Elétrica, foi nomeado como novo CEO da Eletrobras. Ele é formado em engenharia elétrica com ampla experiência no setor elétrico.
Depois de saber do corte no orçamento, Susana Guerra, presidente do IBGE, renunciou, alegando razões pessoais.
Uma análise
1. A tendência política para as próximas semanas é neutra. A tensão entre Bolsonaro e legisladores aumentou em relação às semanas anteriores devido a uma série de situações: o presidente desconsiderou o apoio público de Lira à Dra. Ludhmila Hajjar para tornar-se a nova Ministra da Saúde e fez seu ameaçador discurso de aniversário. Além disso, a terrível situação da Covid-19 no Brasil e suas conseqüências provocaram uma reação da população, do setor privado e dos políticos. A partir do último domingo, quando a “carta” foi divulgada, até o discurso de Lira na quarta-feira, houve uma evidente mudança no comportamento de Bolsonaro em relação à pandemia. Isso significa que, em vez de reprimir a pressão, Bolsonaro acomodou-a e reagiu para evitar conflitos. Além disso, os membros do Congresso estão pressionando o governo sobre a demissão de Araújo e do assessor internacional. O Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, é outro ministro que os legisladores desejam ejetar do governo.
A linha de base analítica para as semanas seguintes é a persistência da tensão entre os poderes Executivo e Legislativo. Depois disso, ela voltará a uma era de pré-tensão ou evoluirá para uma condição de conflito? Muito difícil de dizer, mas parece mais provável que retorne a uma tendência positiva do que de deterioração. Em primeiro lugar, não houve mudanças estruturais significativas no contexto político que nos permitam dizer que a política tende a piorar. Bolsonaro tem apoio popular constante de 30%, o controle das comissões legislativas mais importantes, a vacinação está aumentando e os pagamentos de emergência poderão melhorar sua taxa de aprovação. Em segundo lugar, Bolsonaro foi politicamente hábil para acomodar parte dessa pressão dos líderes empresariais e do Congresso. Ele não quer aceitar completa e rapidamente os pedidos de mudanças ministeriais porque isso poderia enviar uma mensagem errada a seus apoiadores, mas ele incorporou a maior parte da parte dos pedidos relacionados à gestão e à comunicação governamentais. Portanto, a deterioração do contexto político poderia ocorrer caso Bolsonaro tentasse adotar uma postura radical contra o Covid-19, confrontando legisladores, governadores e elites empresariais, mas este é um cenário improvável por enquanto.
2. A economia também está em modo neutro. Não houve mudanças significativas nas políticas fiscal ou monetária para justificar quaisquer mudanças, e o mesmo vale para os resultados do comércio e do desemprego. Analistas de mercado expressaram preocupação de que o agravamento da pandemia iria impulsionar mais os gastos públicos, pesando sobre a inflação e exigindo uma postura mais agressiva da BCB. Entretanto, como sugerem as recentes medidas do governo relacionadas ao Covid-19, a economia poderia recuperar seu caminho de recuperação se a pandemia retrocedesse.
3. A mudança no Ministério da Saúde parece ter sido uma melhoria. Queiroga está advogando por uma abordagem baseada na ciência, e ele estancou a perda de confiança no Ministério da Saúde. Não só isso, mas Bolsonaro também parece ter incorporado a nova postura, pelo menos parcialmente. Entretanto, é muito cedo para dizer que poderia trazer uma aumento efetivo na resposta da Covid-19.
O Ministério das Relações Exteriores e o Ministério do Meio Ambiente estão no radar dos parlamentares. Os senadores exigem que ambos os ministros sejam substituídos rapidamente, acusando-os de má administração, influenciando negativamente a presença internacional do Brasil. Após a situação com a senadora Kátia Abreu, a pressão para a demissão do ministro Araujo atingiu um novo pico.