Toda vez que explico o processo de políticas públicas, a “formação da agenda” gera muitas perguntas interessantes. “Como que entra na agenda, por que aparece, como é que tira, como é que põe….”. Querem um exemplo? A MP 979/20.
A MP autorizava o Min. Educação a nomear reitores e vice-reitores para universidades federais sem consulta à comunidade acadêmica durante a pandemia. Foi rejeitada pelo Sen. Davi Alcolumbre e devolvida ao Planalto. Esta semana (ainda é terça-feira), apareceram dois projetos sobre o tema: o PL 3323/20, do Senador Cid Gomes (PDT/CE), propõe prorrogar o mandato; o PL 3286/20, do Senador Jean Paul Prates (PT/RN), propõe realização de consulta virtual à comunidade.
Simples assim, um assunto entra na agenda de 2/81 senadores. Neste caso, dois senadores entenderam ser pertinente aperfeiçoar o processo de escolha como reação a uma MP. Poderia ser por qualquer outro motivo, como uma notícia da mídia, ou pedidos de eleitores. Como surgiu, em primeiro lugar, a ideia de editar a MP na solução proposta, eu não sei responder, mas a justificativa oferece pistas: existe uma pandemia, alguns mandatos de dirigentes vão ser encerrados em breve; universidades paralisaram suas atividades em função das recomendações de isolamento social; assim, é urgente solucionarmos o problema, cuja solução é a indicação desses dirigentes pelo Ministro da Educação.
Observem que o problema é importante e precisa ser resolvido. Três atores legítimos no processo propuseram soluções diferentes. Ainda não se sabe qual delas (ou outra, quem sabe) será normatizada. Poucas propostas evoluem para as etapas subsequentes e raramente chegam a nascer da forma em que foram concebidas. Por quê?
Primeiro, porque toda política pública é um processo submetido a uma lógica decisória política. O resultado de quem (o político) ou o que (intituição) sai mais forte do processo tem mais importância do que o resultado política pública em si. Segundo, a natureza do tema tem inescapável influência em política pública: um discreto tema corporativo ou tributário é árido, sem graça para a mídia, sem importância direta para o cidadão comum; uma alíquota do IRPF já ocuparia instantaneamente os trending topics do Twitter, capas de jornais e depoimento de especialistas. Não é uma questão de mérito, mas de escassez de tempo, interesse e impacto de toda a sociedade.
Quanto ao caso dos reitores, vamos acompanhar o caso como exercício didático.